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Publicado em 06/10/2016

Lucros capitalizados não se comunicam (Valor Econômico)

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, recentemente, que o lucro empresarial destinado a reinvestimento está contido no patrimônio das ações existentes e, portanto, não representa item autônomo e novo a ser partilhado por casal de companheiros, após a dissolução de união estável.

No caso, a recorrente buscava ver reconhecido o direito de divisão dos lucros nas empresas das quais seu ex-companheiro participava como sócio. O STJ entendeu que “a capitalização de reservas e lucros decorrentes da própria atividade empresarial constitui produto da sociedade por incrementar o seu capital social. A quantia destinada à conta de reserva, que não é distribuída aos sócios, não integra o acervo comum do casal, tendo em vista pertencer apenas à sociedade, e não ao sócio.”

A decisão é adequada. Com efeito, o lucro acumulado por uma sociedade no exercício de suas atividades integra o seu próprio patrimônio e não o de seu sócio. É riqueza da empresa e, enquanto não distribuída, gera apenas e tão somente uma expectativa futura de renda para o sócio, o que se consolidará se e quando houver o pagamento de dividendos a ele.

Ainda que toda e qualquer sociedade tenha por objetivo a geração de lucros, que seja requisito essencial para a constituição de sociedade que o seu contrato preveja a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas (Código Civil, artigo 997, VII), que seja nula a estipulação contratual que exclua qualquer sócio de participar dos lucros e das perdas (Código Civil, artigo 1.008), e que nem o estatuto social nem a assembleia possam privar o sócio ou o acionista do direito de participar dos lucros sociais (Código Civil, artigo 1.009, I), o seu pagamento aos sócios depende de prévia deliberação, respeitadas as disposições sobre política de reinvestimento e de distribuição de dividendos.

Nas sociedades por ações, a previsão acerca dessa deliberação encontra-se no artigo 132, II, da Lei nº 6.404 (Lei das S.A.), de 1976, e determina que “anualmente, nos quatro primeiros meses seguintes ao término do exercício social, deverá haver uma assembleia para deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos”, à qual cumpre acatar dispositivos legais que tratam das reservas e retenções de lucros, bem como de eventual direito à percepção de dividendo obrigatório (artigo 202 da Lei das S.A.).

Caso a destinação dada pela assembleia ao lucro tenha sido pelo aumento do capital mediante sua capitalização, não há qualquer direito de crédito por parte do sócio, posto que a capitalização, ainda que bonifique quotas ou ações aos sócios, não equivale a um novo aporte ou ingresso de recursos, mas sim ao aproveitamento de sua própria riqueza pela sociedade.

Com efeito, Modesto Carvalhosa assevera que “o aumento mediante capitalização dos lucros ou de reservas constitui mero remanejamento de valores já existentes no balanço, não havendo, consequentemente, mudança no volume financeiro, nem entrada de novos valores no patrimônio social, nem aumento do encargo dos acionistas”. Para ele, “o aumento é contábil porque a elevação do valor do capital é produzida sem mudança efetiva na consistência do patrimônio”. Em termos práticos, a capitalização pode ser representada simplesmente por uma transferência nos registros contábeis da empresa.

E, por não constituir ingresso de riqueza nova, a própria Lei das S.A. dispõe que “na companhia com ações sem valor nominal, a capitalização de lucros ou de reservas poderá ser efetivada sem modificação do número de ações” (artigo 169, parágrafo 1º), o que robustece a tese de que os aumentos de capital com lucros ou reservas não acrescem o patrimônio do sócio.

Caso a destinação dada pela assembleia ao lucro tenha sido a distribuição aos sócios, essa declaração de dividendos a serem pagos opera duas consequências. Para a sociedade cria-se um passivo, uma obrigação de pagar, enquanto que para o sócio cria-se um ativo, um direito de crédito contra a sociedade, este sim a adicionar ao patrimônio do casal.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), no Parecer nº 16, de 1979, defende que o acionista somente será reconhecido como legítimo credor da sociedade em relação aos lucros após a aprovação de sua distribuição em assembleia específica: “Constituir-se-á o dividendo em uma exigibilidade irrevogável, tão somente, após a sua aprovação pela assembleia geral, quando então, ocorre efetivamente a declaração de dividendos nos termos da lei. Este fato vincula a companhia e coloca o acionista na posição de seu credor, independente de qualquer outra formalidade”.

Diante do contexto, transportada a questão para o caso em análise, a expectativa de percepção de lucros pelo sócio somente se concretiza em um patrimônio novo e partilhável após a declaração de tal direito em assembleia. Antes disso, não há direito constituído a agregar o patrimônio. Não há crédito a ser partilhado. Tampouco há fruto a ser compartido, vez que lucros ou reservas capitalizados não integram o patrimônio comum do casal, realizados que são com a riqueza da própria empresa.

Márcia Setti e José Henrique Longo são especialistas em planejamento sucessório e organização patrimonial e sócios do PLKC Advogados.

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