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Publicado em 16/07/2024
Por Alexandre Fuchs das Neves
Esta ficção jurídica ocorre quando tentamos responsabilizar a “empresa pelas dívidas contraídas por seus sócios e tem como requisito o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou a confusão patrimonial (CPC, art. 133, § 2º; CC, art. 50).
Trata-se de medida excepcional, cabível quando se comprova que o devedor (pessoa física) utilizou-se indevidamente da pessoa jurídica para resguardar bens e valores de seu acervo pessoal, a fim de esquivar-se de seus compromissos financeiros.” Acórdão 1367498, 07200527220218070000, Relator: DIAULAS COSTA RIBEIRO, Oitava Turma Cível, data de julgamento: 26/8/2021, publicado no DJE: 9/9/2021.
Trecho de acórdão:
“A Teoria da Desconsideração Inversa da Personalidade Jurídica foi adotada expressamente pelo Código Civil Brasileiro de 2002, com alteração dada pela Lei 13.874/2019, ao consagrar a possibilidade de atingir bens de pessoa jurídica diversa da relação processual quando o devedor principal formalmente transfere bens para esta para se esquivar da sua obrigação material.”
Noutras e claras palavras, quando a pessoa física transfere para uma pessoa jurídica, notadamente as holdings patrimoniais, seus bens, para saiam do radar da persecução patrimonial em sede de demanda de execução, fazendo “desaparecer” seu painel patrimonial e , nesta senda, tornando a execução frustrada, ou seja, sem solução.
A confusão patrimonial ou o desvio de finalidade , nos termos do art 50 do Código Civil Brasileiro, no seu caput determina os efeitos de obrigações de pessoas jurídicas para com seus sócios e, nos termos do mesmo artigo, no seu § 3º, introduzido pela Lei 13.874/2019, consagra a chamada desconsideração inversa da personalidade jurídica, cujo cabimento era reconhecido havia muito tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.
Nessa última modalidade, a desconsideração revela-se útil quando o devedor, para esquivar-se de seus credores, formalmente transfere seus bens particulares a pessoa jurídica sob seu controle direto ou indireto. Em tais casos, a extensão dos efeitos da obrigação do sujeito devedor à pessoa jurídica por ele controlada frustra a manobra fraudulenta, pois permite que o credor se satisfaça à custa do patrimônio social. Curiosamente, uma das primeiras ocorrências de desconsideração da personalidade jurídica já relatadas deu-se na modalidade inversa. Trata-se do caso First National Bank of Chicago v. Trebein Company, julgado em 1898. Para evitar que seu patrimônio fosse consumido por suas dívidas, F.C. Trebein constituiu, com quatro familiares, a empresa Trebein Company, transferindo-lhe todos os seus bens. No entanto, seus credores acusaram a manobra e afirmaram em juízo que a companhia havia sido criada com o propósito de defraudá-los. O argumento foi acolhido pela Suprema Corte de Ohio, que considerou a empresa responsável pelo pagamento das dívidas de F. C. Trebein. ( fonte: https://www.conjur.com.br/2024-jul-13/blindagem-de-patrimonio-e-suficiente-para-desconsiderar-personalidade-juridica/)
Então a desconsideração inversa da personalidade jurídica basicamente permite que se possa ingressar na empresa/participação societária daquele que, em manobras escusas, buscou ocultar patrimônio dos credores, remetendo-os para outra empresa, de cunho familiar e/ou de partes relacionadas, tais como procuradores ou representantes, que neste caso atuam como “laranjas”.
O patrimônio em sí jamais saiu da esfera de controle do devedor, este apenas usou ferramentas de tecnologia societária para baralhar o entendimento, tanto do credor quanto do Judiciário.
(…) Com efeito, de acordo com a doutrina, ‘a fraude que a desconsideração Invertida coíbe é, basicamente, o desvio de bens. O devedor transfere seus bens para a pessoa jurídica sobre a qual detém absoluto controle. Desse modo, continua a usufruí-los, apesar de não serem de sua propriedade, mas da pessoa jurídica controlada” (COELHO, Fábio Ulhôa, Curso de Direito Comercial, Volume 2: Direito de Empresa. 20ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, pág. 70). (fonte: https://www.conjur.com.br/2024-jul-13/blindagem-de-patrimonio-e-suficiente-para-desconsiderar-personalidade-juridica/)
Ainda, devemos atenção ao Enunciado 283 do Conselho da Justiça Federal, em que se delimita: “É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada ‘inversa’ para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros“.
Fique atento, tanto na constância das operações quanto nas demandas, em pessoas jurídicas constituídas com bens que migraram do painel patrimonial do devedor e faça aplicar a teoria da desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo e da ABRAFESC.