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Publicado em 27/04/2021
Por Alexandre Fuchs das Neves
A Lei 8.009/90 veio para proteger o imóvel residencial do devedor e da sua unidade familiar, preservando o mínimo necessário para a moradia, contra dívidas contraídas, cujas exceções estão na própria Lei. Devemos lembrar que a proteção estende-se para a unidade familiar, ou seja, não apenas o devedor, mas seus filhos, pais, cônjuge. Mas como fica a penhorabilidade do imóvel, quando o próprio devedor oferta em garantia de suas dívidas?
Muitas são as correntes sobre o tema, algumas entendem que o devedor não pode abrir mão desta proteção, por ser de ordem pública, e defender também a unidade familiar, que muitas vezes não tem condições de se decidir sobre o tema, quer porque menor de idade ou por não estar diretamente titularizado na Matrícula. No caso abaixo, o devedor declinou da proteção e ofertou bem residencial em garantia de dívida, senão vejamos:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.560.562 - SC (2015/0254708-7) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE : JHULIA MACHADO LIMA RECORRENTE : MARIA LUIZA MACHADO LIMA (MENOR) RECORRENTE : THOMAZ FERNANDES LIMA - POR SI E REPRESENTANDO RECORRENTE : ADRIANA NUNES MACHADO LIMA - POR SI E REPRESENTANDO ADVOGADOS : RUD GONÇALVES DOS SANTOS E SILVA - SC007307 MURILO ANTUNES PEREIRA - SC032768 RECORRIDO : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL ADVOGADOS : VOLNIR CARDOSO ARAGAO - RS028906 ANDREIA AMARILHO E OUTRO(S) - SC007488 LEANDRO DA SILVA SOARES E OUTRO(S) - DF014499 EDSON MACIEL MONTEIRO - SC012732 EMENTA DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL RECONHECIDO COMO BEM DE FAMÍLIA. POSSIBILIDADE. CONDUTA QUE FERE A ÉTICA E A BOA-FÉ. 1. Ação declaratória de nulidade de alienação fiduciária de imóvel reconhecido como bem de família. 2. Ação ajuizada em 23/08/2013. Recurso especial concluso ao gabinete em 26/08/2016. Julgamento: CPC/73. 3. O propósito recursal é dizer se é válida a alienação fiduciária de imóvel reconhecido como bem de família. 4. A questão da proteção indiscriminada do bem de família ganha novas luzes quando confrontada com condutas que vão de encontro à própria ética e à boa-fé, que devem permear todas as relações negociais. 5. Não pode o devedor ofertar bem em garantia que é sabidamente residência familiar para, posteriormente, vir a informar que tal garantia não encontra respaldo legal, pugnando pela sua exclusão (vedação ao comportamento contraditório). 6. Tem-se, assim, a ponderação da proteção irrestrita ao bem de família, tendo em vista a necessidade de se vedar, também, as atitudes que atentem contra a boa-fé e a eticidade, ínsitas às relações negociais. 7. Ademais, tem-se que a própria Lei 8.009/90, com o escopo de proteger o bem destinado à residência familiar, aduz que o imóvel assim categorizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário. 8. Não se pode concluir que o bem de família legal seja inalienável e, por conseguinte, que não possa ser alienado fiduciariamente por seu proprietário, se assim for de sua vontade, nos termos do art. 22 da Lei 9.514/97. 9. Recurso especial conhecido e não provido.
A Relatora Ministra Nancy Andrighi bem reconheceu a necessidade de manutenção da boa-fé objetiva e ainda, “ademais, tem-se que a própria Lei 8.009/90, com o escopo de proteger o bem destinado à residência familiar, aduz que o imóvel assim categorizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário”.
Noutras palavras, o devedor não estaria impedido de alienar o bem residencial, por vontade própria, mas cabe lembrar que este é um entendimento, e não um recurso repetitivo.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.