DAÇÃO EM PAGAMENTO DE DÍVIDAS: RECEBEU O BEM, BELLA CIAO!

As relações do setor com o cliente nem sempre são tranquilas, a ponto de fluir sem marchas e contramarchas. Identificamos, em especial na dação em pagamento, um certo receio de, de fato, receber o bem.

De início, deixamos claro que a dação em pagamento, quando feita sem vícios, mesmo que por bens de terceiros, capazes e cientes do que estão fazendo, em tese é legalmente perfeita e acabada, e deve ser usada como forma de resolver determinada pendência, que por outra forma não poderia ser resolvida.

O problema está nas situações acobertadas pelos documentos, ou seja, a intenção não era bem a dação, e sim uma garantia. No caso hipotético, transfiro o bem para a fomento, e ato contínuo, faço um contrato de locação com o antigo proprietário, cujo valor da locação é, de fato, o valor das parcelas de uma confissão de dívida de fato (não escrita).

Pagos os aluguéis por determinado tempo, tem o antigo proprietário o direito de preferência pelo imóvel.

Até aqui, nada de errado, não fossem os diversos julgados sobre o tema, em especial o recente do TJ-SP

Despejo por falta de pagamento. Vício de simulação reconhecido. Dação de imóvel em pagamento seguida de locação para dissimular pacto comissório, vedado nos termos do artigo 1.428 do Código Civil. Simulação reconhecida. Locação inexistente. Recurso provido para julgar improcedente a ação de despejo cumulada com cobrança. Prejudicado o Agravo Interno. (TJSP; Agravo Interno Cível 1000287-84.2018.8.26.0431; Relator (a): Pedro Baccarat; Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado; Foro de Pederneiras - 2ª Vara; Data do Julgamento: 23/07/2019; Data de Registro: 23/07/2019)]

Bem reconheceu o relator que:

Diz que a dação em pagamento e o subsequente contrato de locação são fictícios e destinados a dissimular pacto comissório.

Em favor de sua tese aponta a circunstância do contrato de dação em pagamento ter sido firmado em janeiro de 2013 para pagamento de dívidas decorrentes de operações de factoring envolvendo títulos vencidos no período de 07 de dezembro de 2013 a 21 de janeiro de 2014.

Ora, a dívida tem origem no inadimplemento de cheques vencidos e não honrados, em período posterior ao da dação em pagamento, quadro que evidencia tratar-se de alienação antecipada em garantia, de sorte a assegurar ao credor que fique com o objeto da garantia no caso de inadimplemento, configurando-se, efetivamente, o pacto comissório, vedado pela norma inserta no artigo 1.428 do Código Civil.

Ainda, observou o relator que “o contrato de locação fora firmado um ano depois da dação em pagamento, isto é, em época coincidente com o inadimplemento do contrato de mútuo e com a consolidação do débito, no valor da dação em pagamento.

Sempre orientei: recebeu um bem em dação, transfira imediatamente para o seu nome, tome posse o mais breve possível e entenda: relacionamento com cliente complicado (tóxico) tem prazo de validade!

A busca por minimizar o prejuízo, recuperar totalmente o crédito ou mesmo a expectativa de ganho com um cliente nessas condições acaba por imputar maiores e pesadas perdas para a empresa.

Lamentavelmente, o julgado em comento não é o primeiro, e nem será o último a interpretar o caso.

Então, aceite que, recebido o bem, aceite o prejuízo, transfira para seu nome, tome posse e Bella Ciao!

Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.

(Publicado em 25/07/2019)

Video institucional

Cursos EAD

Fotos dos Eventos

Sobre o Sinfac-SP

O SINFAC-SP está localizado na
Rua Libero Badaró, 425 conj. 183, Centro, São Paulo, SP.
Atendemos de segunda a sexta-feira, das 9 às 18 horas.