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Lamentavelmente, quer por erro ou fraude, ainda são comuns as cessões da mesma duplicata para mais de uma empresa do nosso setor, gerando enorme insegurança jurídica, inclusive para o sacado.
Certamente, este acontecimento é um dos motivos que levam os sacados a não confirmar ou mesmo pagar duplicatas que circularam.
Antes, é necessário atentar para o fato do sacado que, se cobrado por mais de uma empresa, com base no mesmo direito creditório, tem o direito de ajuizar a chamada ação consignatória, em que ele deposita em Juízo o valor, para liberar-se da dívida, estando a regra prevista no art 335, IV, do Código Civil: “se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento”.
A ação de consignação é bifásica, ou seja, primeiro o juiz decidirá se o sacado depositou o valor correto e, se assim ocorrer, fica ele liberado da dívida.
Depois, num segundo momento, mas no mesmo processo, em havendo mais de um credor que se apresentar, o Juiz decidirá para quem será liberado o valor.
Então, vamos ao caso concreto, em que o TJ-SP julgou uma disputa de três empresas do nosso setor, que negociaram a mesma duplicata:
CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - Segunda fase - Dúvida acerca do pagamento do título para três cessionárias - Questão que se soluciona indicando-se quem por primeiro se tornou detentor do crédito, o que deve ser dar por meio escrito, com válida notificação, na forma do art. 290 do Código Civil - Provas que indicam a cessão para uma das faturizadoras, a qual deve ser pago o valor - Ciência inequívoca, ademais, da devedora, que houve a cessão dos créditos - Recurso desprovido e, por ser a sentença publicada já na vigência do NCPC, são majorados os honorários advocatícios de 15% para 20% do valor da condenação (art. 85, § 11, do NCPC) (Apel. nº 0207506-54.2011.8.26.0100).
No caso concreto, o TJ-SP entendeu por resolver a demanda pelo critério do momento da cessão: “O desate da controvérsia, em que três cessionários disputam o crédito, é saber quem por primeiro se tornou detentor do crédito é que o receberá, o qual deve ser dar por meio escrito. Isso porque, nas cessões posteriores, a cedente já não ostentava titularidade do crédito, e, consequentemente, não o poderia ceder validamente.”
Para reforçar o seu voto, o desembargador relator usou precedente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que igualmente decidiu com base no critério do momento da cessão:
"Consignação em pagamento. Segunda fase do processo. Exegese do artigo 898 do CPC. Duplicidade de duplicatas. Pluralidade de credores. Levantamento dos valores depositados. A preferência para o levantamento da quantia depositada pertence à parte que primeiro se tornou credora da endossante da cambial. Adoção do critério cronológico confere maior segurança à solução da lide. Apelação improvida" (TJ-RS - Ap n° 70017335688 - Igrejinha - 19ª Câmara Cível - Rel. Des. JOSÉ FRANCISCO PELLEGRINI, j. em 6-4-2010).
Este critério atende ao determinado no art. 291 do Código Civil: “Ocorrendo várias cessões do mesmo crédito, prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito cedido.”
E, como a tradição (entrega) do título ocorre quando da assinatura do termo aditivo, é de suma importância que, nas operações digitais, seja usado o carimbo do tempo, valendo igualmente lembrar sua função de certificar a data e hora exata em que o documento recebeu a assinatura com certificação digital.
Bom, para a empresa que perdeu a demanda consignatária, por evidente, cabe o regresso contra o cedente, se ele ainda estivar operando!
A íntegra da decisão pode ser acessada pelos associados do SINFAC-SP, mediante login e senha.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.