DUPLICATA VIRTUAL EM GOTAS (PARTE 2)

Dando seguimento ao tema, desta vez falaremos brevemente sobre o documento digitalizado (duplicata), sempre lembrando que uma duplicata digitalizada não é um documento nascido digital (era física, e posteriormente foi digitalizada).

Pois bem, este tipo de documento tem uma fragilidade, exatamente porque é mera copia do documento original, como se fosse uma fotocópia.

E a pergunta que se faz é: tem validade? Depende...

Vejamos o que fala o novo Código de Processo Civil sobre o uso de um documento digitalizado:

Art. 425. Fazem a mesma prova que os originais:

VI - as reproduções digitalizadas de qualquer documento público ou particular, quando juntadas aos autos pelos órgãos da justiça e seus auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pela Defensoria Pública e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições públicas em geral e por advogados, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração.

Acima, vimos que a lei permite que a reprodução digitalizada faça a mesma prova que o original, mas coloca a possibilidade de impugnação, desde que seja motivada e fundamentada da sua alteração.

Então estamos falando de uma falsidade, que pode consistir em:

  • Criar um documento não verdadeiro, ou seja, gerar uma duplicata unilateralmente (feito pela empresa de fomento ou securitizadora).
  • Alterar dados constantes num documento verdadeiro (idem, praticado por uma empresa do setor).

Pouco ou nada provável que uma empresa do setor crie uma duplicata do nada. Atuando mais de duas décadas na área, nunca vi isso acontecer.

Bom, sobra a alteração de dados e, se tivermos que enfrentar esta situação em Juízo, cabe situar o juiz na sua valoração da prova, ou seja, outros elementos circunstanciais do caso concreto, por exemplo:

  • Habitualidade: a forma pela qual as operações normalmente ocorriam, posto que os usos e costumes são relevantes fontes de direito, quando falamos em direito comercial.
  • Identidade da duplicata com a nota fiscal: todos sabemos que a Lei nº 5.474/1968 (Lei das Duplicatas) determina que a duplicata (e justamente por isso seu nome) guarda identidade com a nota fiscal-fatura. Se existe a nota fiscal, e modernamente ela é eletrônica, e a os dados são os mesmos, num primeiro momento afastamos a geração e alteração dos dados constantes no documento digitalizado.
  • Testemunhas: o pessoal envolvido nas operações, tanto do cedente quanto do sacado, conheciam a forma procedimental das operações rotineiras.
  • Aditivo contratual: que certamente inclui os dados de determinada duplicata que se busca impugnar a veracidade. Tal aditivo segue igualmente a forma costumeira de operar, podendo ser provado pelos termos acima.
  • Pagamento da operação: normalmente paga na conta do cedente ou, se para terceiros, mediante autorização expressa e quase sempre rotineira. Dificilmente pagamos para terceiros de forma isolada, ou seja, normalmente o cedente nos pede para pagar certos e determinados terceiros, relacionados, e que, novamente, fazem parte dos usos e costumes entre as partes.
  • A transferência e cobrança da duplicata: ora, se a duplicata não foi transferida, ou se foi noutros termos (valores, datas etc.), porque então o cedente não as cobrou, ou não reclamou quando o cessionário fez a cobrança?

Complementando, devemos lembrar sempre que o dever de provar a falsidade é de quem alega, e esta alegação tem que ser motivada e fundamentada. Ser o documento digitalizado, sem entrar no seu conteúdo ou existência, não é motivo.

Então, nesta segunda parte vimos que uma duplicata digitalizada não é uma duplicata digital (nativa digital), e que seu uso guarda alguns consideráveis riscos, que podem ser superados, mas estão latentes na operação, e dependerão sempre da vontade da parte em usar o processo judicial como forma de fugir dos seus compromissos, muitas vezes usando o Judiciário somente porque ele é moroso e tem enormes dificuldades em compreender esta forma de operação.

Por isso alertamos do risco!

No próximo texto, veremos como é possível a emissão de uma duplicata de fato digital, e a sua aceitação pela legislação em vigor.

Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.

Texto publicado em 02/03/2017

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