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Publicado em 26/10/2021
Por Alexandre Fuchs das Neves
Todos sabemos - ou deveríamos saber, que uma das características dos títulos de crédito é a apresentação e resgate. Explico:
a) O credor, para receber o valor descrito no título de crédito, deve apresentar o titulo ao devedor.
b) e o devedor, ao pagar, tem o direito de resgatar o título.
Ora, se o titulo foi negociado com uma fomento, como pode o sacado – no caso em comento, o emitente de um cheque, pagar para quem não tem mais a posse do mesmo, ou seja, não pode mais devolver o título de crédito?
Ainda, o devedor tomou ciência da transferência da titularidade quando da intimação para protesto do cheque, ou seja, naquele ato entendeu o Julgador que ocorrera a notificação valida, para que o emitente do cheque soubesse, claramente, que o cheque não mais pertencia ao cedente, e por conta disso, não poderia o cedente dar quitação. E o pagamento ocorreu após a intimação do tabelionato de protestos, realizado justamente para o cedente que, cabe repetir, não era mais o credor. Vejamos (grifo nosso):
APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. Sentença de improcedência quanto à empresa faturizadora. Inconformismo da autora. Cheques transmitidos por contrato de fomento mercantil. Caracterização de cessão de crédito, e não de mero endosso, em razão na natureza mercantil da relação entre faturizada e faturizadora. Aplicação das normas civis que regulam a cessão de crédito. Jurisprudência desta E. Corte. Discussão da causa debendi. Oposição de exceções ao cessionário. Possibilidade. Notificação da cessão de crédito realizada no momento da protocolização dos títulos junto ao Tabelionato de Protesto. Pagamento ao credor primitivo após a notificação de cessão não desobriga o devedor perante o credor cessionário. Inteligência do art. 292, CC. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1007564-59.2019.8.26.0224; Relator (a): Régis Rodrigues Bonvicino; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guarulhos - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 23/10/2021; Data de Registro: 23/10/2021).
Segue o Relator, discorrendo sobre o tema (grifo nosso):
Os títulos foram protestados em 2014. Portanto, antes de proceder ao registro do protesto, o Tabelião intimou a devedora. E, por aplicação da Lei nº 9.492/97, conclui-se que esta intimação continha, obrigatoriamente, as informações relevantes a respeito do título, inclusive o nome do credor-endossatário. Ou seja, em 2014, por ocasião do protesto, a autora foi notificada acerca da cessão de crédito, conforme determina o art. 290 do Código Civil. Entretanto, pagou a quantia devida após o protesto, em 2018, ao credor primitivo. Dessa forma, o pagamento por ela efetuado não a desobriga perante a credora Cumbica Factoring Mercantil Ltda, já que realizado após a notificação da cessão de crédito. Nessas circunstâncias, como bem apontado pela r. sentença, a empresa cessionária deve ser considerada como terceira de boa-fé.
Neste caso, a intimação do tabelionato foi considerada como notificação, mas de qualquer sorte, dependendo do apetite pelo risco que sua empresa tenha, sempre aconselhamos que a notificação seja feita o mais breve possível, para evitarmos um “susto” como este.
Ao final, tudo correu bem, mas o desfecho poderia ser diferente!
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP e da ABRAFESC.