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Publicado em 06/02/2024
Por Alexandre Fuchs das Neves
Consabido nos tribunais que a nota promissória em garantia de contrato de factoring tem sua emissão reconhecida como abusiva. Mas tal abusividade é relativa, porquanto a fomentada sempre será responsável pela veracidade do titulo negociado, caso contrário estaríamos prestigiando minimamente o delito de emissão de duplicata sem origem, dentre outros, e a atuação completamente contrária ao que se espera da boa-fé objetiva.
Pois o caso presente trata-se de duplicata comissária paga pelo sacado diretamente ao cedente que, uma vez executado exatamente com base na nota promissória, buscou fugir da boa-fé objetiva, escondendo-se sob o pálio da impossibilidade de emissão de nota fiscal para garantir o regresso.
Mas o TJSP, atendo ao caso, assim se posicionou (grifo nosso):
EMBARGOS À EXECUÇÃO – Contrato de fomento mercantil, com desconto de duplicata – Pagamento parcial, com cobrança do saldo remanescente – As peculiaridades do caso concreto autorizam a responsabilidade dos embargantes porque a questão central, revelada no decorrer do processo, não está no risco do inadimplemento inerente ao contrato firmado entre as partes, mas na má-fé pelo recebimento direto do valor do título da sacada, sem repasse, frustrando dolosamente a avença – Litigância de má-fé mantida, com afastamento da indenização e imposição de multa – Recurso parcialmente provido, com determinação. (TJSP; Apelação Cível 1123253-67.2021.8.26.0100; Relator (a): Vicentini Barroso; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 26ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/01/2024; Data de Registro: 02/02/2024)
Vejamos as razões do Des. Relator:
O feito executivo foi devidamente instruído com documentos reveladores de obrigação certa, líquida e exigível, em consonância com os artigos 783 e 803, I, do CPC.
Ocorre que a duplicata descontada na operação de factoring não foi adimplida, ou melhor, não foi adimplida à faturizadora, pois a faturizada recebeu o pagamento do título diretamente da sacada.
A sacada, XX, instada pelo juízo a quo a informar para quem foi pago o valor da nota fiscal de fl. 126 (fls. 87/88, 134 e 138), apresentou comprovante de pagamento em favor da empresa-apelante (cedente)a (fls. 148/150).
A alegação de divergência dos valores não infirma o pagamento, pois contemporâneo à emissão do título; depois, é provável o pagamento conjunto com outros títulos sacados, já que a (sacado) é uma das principiais clientes da empresa-apelante. Sendo assim, inadmissível a postura adotada pelos apelantes.
E vale reforçar parte do voto que resta extremamente claro sobre o comportamento do fomentando que “Receberam o valor do título cedido, sem repasse à faturizadora, flagrante a má-fé, notadamente porque “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé” (art. 422, CC). As peculiaridades do caso concreto autorizam a responsabilidade dos apelantes porque a questão central, revelada no decorrer do processo, não está no risco do inadimplemento inerente ao contrato firmado entre as partes, mas na má-fé pelo recebimento direto do valor do título da sacada, sem repasse, frustrando dolosamente a avença questão ligada à existência do crédito. Houve duplo recebimento em flagrante enriquecimento sem causa, o que é vedado. (grifo nosso)
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo e da ABRAFESC.