FATOR DE COMPRA NÃO É JUROS E, PARA DESCONSTITUIR DAÇÃO EM PAGAMENTO, DEVEDOR PRECISA PROVAR COAÇÃO

Julgada em 2 de junho, a Apelação nº 1023703-80.2013.8.26.0100 deslindou questão levantada por devedor que, alegando vícios, tentou desconstituir escritura pública de dação em pagamento de imóvel, para quitação de sucessivas confissões de dívidas não pagas.

Mas o desembargador-relator Gilberto dos Santos, usando do princípio do “homem comum”, ou seja, o que se espera do comportamento de determinada pessoa, levando em consideração suas experiências, cultura, área de atuação e etc., interpretaria e faria no caso concreto, chegando a brilhante conclusão:

Mas, mesmo que tenham os apelantes assinado a Escritura Pública de Dação de Imóvel em Pagamento por suposta coação, esta não ficou bem caracterizada nos autos. Nos termos do artigo 151 do Código Civil, a coação para viciar a vontade no negócio deve ser tal que “incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens”. 

Mas, ao que se vê, as características do paciente, no caso em concreto XXXX,  considerando-se seu tino comercial na qualidade de empresário de firma de médio porte, não permitem concluir que a decisão fora “irrefletida” (CC, art. 152). 

Depois, a ameaça a que a lei considera como causadora efetiva da “coação” viciante não é aquela decorrente do “exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial” (CC, art. 153). 

E aqui parece ser o que aconteceu: a ré não estava obrigada a estender linha de crédito a quem já estava com saldo devedor. Logo, se não era dado aos autores alegarem sua própria torpeza no contrato celebrado com a ré, a Escritura de Dação em Pagamento de Dívida tem sua validade confirmada. 

Conquanto essa negociação possa ser chamada de, no mínimo, ousada, por ambas as partes, já que partiam do pressuposto de que o pacto (entrega do imóvel) cuidava do “pagamento” (ou garantia) de uma dívida consolidada e outra que estava por ser gerada no futuro, o fato é que essa dívida consolidada existiu mesmo. 


E também outras dívidas foram contraídas, donde o aperfeiçoamento da condição estabelecida pelas partes.

Afastada a declaração de nulidade do ato (dação em pagamento), igual brilhantismo o relator manifestou no que se refere à compreensão dos encargos da nossa atividade, afastando-os dos juros:

Tocante aos negócios de fomento mercantil que deram origem ao endividamento dos autores perante a ré, ficou certo que eles procuraram desmerecer todas as tratativas que tiveram com a empresa de factoring ré, acusando-a da prática de juros abusivos e ilegais, justamente por ela não pertencer ao quadro das instituições financeiras do país. 

Tal argumento, entretanto, não tem o condão de vingar. Nas operações de factoring não cabe falar em juros propriamente porque a remuneração do faturizador é constituída pelo fator, que “é o deságio (diferencial ou comissão) entre o valor de face do título cedido e o pagamento feito pela empresa de factoring” (ANTONIO CARLOS DONINI, Factoring, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 21) (fls. 3393). 

E esse fator, por ser algo mais amplo, englobando uma série de custos de oportunidade e dos financiamentos (dentre eles o dos juros), não se subsume a limites de juros pura e simplesmente. A propósito, a ruína dos negócios dos autores perante a empresa de fomento mercantil também não pode ser atribuída à prática de “recompra de títulos” como insiste em dizer. 

Aqui não se fala em “recompra” de títulos não pagos pelos respectivos sacados (clientes da XXXXX). Ao contrário, a própria solicitação da XXXX à XXXX Fomento Mercantil Ltda., faz crer que tais recompras não se davam por “inadimplência” dos títulos, mas sim por vícios.

Por isso que na respectiva proposta, constou que: “Conforme estipulado no contrato de fomento mercantil, na cláusula 12ª do 'Regulamento Geral', ficamos responsáveis pela legitimidade (vícios) dos títulos negociados. Diante disso, vimos, através da presente, solicitar a recompra dos títulos cedidos, abaixo relacionados, pois os mesmos encontram-se com irregularidades” (fls. 255).


Do julgado tiramos algumas conclusões, em especial na sua parte final, onde remete a por vezes esquecida “carta de recompra”.

Ver por todos em www.tjsp.jus.br.

Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo. 
 

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