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A nota promissória em garantia tem aceitação no Judiciário quando estamos falando de regresso por vício de origem, assim considerada, por exemplo, a duplicata sem origem ou mesmo a falta de entrega da mercadoria, sendo inclusive tema de jurisprudência no STJ (grifo nosso abaixo).
A faturizadora tem direito de regresso contra a faturizada que, por contrato de factoring vinculado a nota promissória, tenha cedido duplicatas sem causa subjacente. Por um lado, a doutrina é praticamente unânime no sentido de que a faturizadora não tem direito de regresso contra a faturizada com base no inadimplemento dos títulos transferidos, haja vista que esse risco é da essência do contrato de factoring e por ele a faturizada paga preço até mais elevado do que pagaria, por exemplo, em um contrato de desconto bancário, no qual a instituição financeira não garante a solvência dos títulos descontados. Por outro lado, essa circunstância não tem o alcance de afastar toda e qualquer responsabilidade da cedente em relação à existência do crédito, haja vista que tal garantia é própria da cessão de crédito comum - pro soluto. É por isso que a doutrina, de forma uníssona, afirma que no contrato de factoring e na cessão de crédito ordinária a faturizada/cedente não garante a solvência do crédito, mas a sua existência sim. Cuida-se, na verdade, de expressa disposição legal, nos termos do que dispõem os arts. 295 e 296 do CC. Nesse passo, o direito de regresso da faturizadora contra a faturizada deve ser garantido quando estiver em questão não um mero inadimplemento, mas a própria existência do crédito. Não reconhecer tal responsabilidade quando o cedente vende crédito inexistente ou ilegítimo representa compactuar com a fraude e a má-fé. É bem verdade que há precedentes do STJ que não permitiram o regresso da faturizadora, em situações que, aparentemente, diziam respeito a duplicatas frias. Em todas essas hipóteses, porém, inexiste nota promissória emitida como garantia do negócio jurídico relacionado ao factoring, o que diferencia os julgados do caso em exame. Por sua vez, em reforço à tese ora adotada, há outros precedentes que permitiram, inclusive, o pedido de falência com base em nota promissória recebida como garantia de duplicatas apontadas como frias endossadas a sociedades de factoring. REsp 1.289.995-PE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/2/2014.
Pois bem, embora a nota promissória seja um título desvinculado da sua causa jurídica subjacente e, assim como qualquer outro título de crédito, tem eficácia processual abstrata (não necessita narrar o fato acontecido), devemos prestar atenção nos caminhos que a jurisprudência aponta, para viabilizar a ação de execução contra o cedente.
Neste aspecto, o TJ-SP decidiu, dando a referida orientação esperada (grifo nosso):
EMBARGOS DE DEVEDOR. Execução. Notas promissórias. Procedência. Extinção do processo executivo. Insurgência da embargada. Notas promissórias. Garantia em contrato de fomento mercantil. Alegação da credora no processo executivo de inadimplemento parcial de obrigações, e não de vício de existência de créditos apontados em duplicatas cedidas em operação de "factoring". Hipótese em que não foram apresentados os títulos transferidos que seriam irregulares por falta ou atraso de entrega de mercadorias pelos embargantes. Impossibilidade de aferição do saldo devedor. Questionamento e indicação de referências de quais duplicatas teriam apresentado algum problema, apenas, por ocasião dos embargos de devedor. Inadmissibilidade. Notas promissórias que não possuem os requisitos de liquidez, certeza e exigibilidade. Mantença integral da conclusão de primeiro grau. Recurso não provido. (TJ-SP; Apelação 1009326-08.2016.8.26.0292; Relator (a): Sebastião Flávio; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jacareí - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 16/03/2018; Data de Registro: 16/03/2018)
Então, devemos municiar a petição inicial com a relação dos títulos inadimplidos – e se possível o motivo da inadimplência, e a soma aritmética da mora, calculada nos termos do contrato.
Aliás, o contrato-mãe sugerido pelo SINFAC-SP, de factoring ou securitização, traz exatamente esta solução, quando determina que, para atender o art. 786, § u, do Código de Processo Civil, reputa-se líquido e certo, para todos os fins de direito, o valor da soma de todos os créditos e/ou títulos que os representem (abrangendo principal e acessórios) objeto das operações formalizadas através deste instrumento e dos respectivos aditamentos a serem celebrados entre as partes, acrescidos dos encargos contratados,incidentes até a data do efetivo pagamento.
Observe a regra imposta pela Jurisprudência, e evite investir recursos em demandas que não prosperarão.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.