PEDIDO DE FALÊNCIA COM BASE EM FRAUDE É POSSÍVEL, MAS A CONFISSÃO DE DÍVIDA REGENERA O FATO

O pedido de falência é visto, quase sempre, com base em título(s) protestado(s) para fins falimentares, e com valor superior a 40 salários mínimos, como regra básica.

Mas a Lei nº 11.101/2005 também prevê o pedido de falência por outros motivos, que não necessariamente títulos protestados, mas, com efeito, mais trabalhosos e complicados, a exemplo dos elencados no art. 94 da referida lei:

Art. 94. Será decretada a falência do devedor que:

I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência;

II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal;

III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial:

a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos;

b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não;

Bom, a letra “b”, do inciso III, do art. 94 acima (pode) se adequar exatamente aos casos de duplicatas fraudadas, emitidas em causa e com a confirmação dada de favor, sem a necessidade de realizar o famigerado, complicado e pouco eficaz “protesto para fins falimentares”, em que tanto a lei quanto o julgador não poupam esforços em ver desconstituído por qualquer singela razão, tudo na proteção da empresa.

De outra banda, raros são os tabelionatos que sabem, de fato, como realizar o ato, como se suas estruturas legais não participassem do mesmo Poder Judiciário.

Retornando ao tema, a lei tem esta previsão expressa, mas também como referido, o caminho para chegarmos ao deferimento da falência é bem mais longo e tortuoso que pelas vias já conhecidas, mas não é impossível.

Tudo anda bem, desde que não tenhamos uma confissão de dívida no meio do caminho.

Todos sabemos que uma confissão de dívida tem o poder de novar, ou seja, trocar uma dívida (e uma dúvida) antiga por uma dívida, e agora também uma certeza, colocando uma pá de cal no passado.

Não importa a criatividade que seja possível constar na peça de confissão de dívida, o fato é que, legalmente, opera-se a novação.

Então, vejamos o que o TJ-SP exarou recentemente, em demanda que buscava o pedido de falência de uma empresa que já estava em recuperação judicial, exatamente com base na letra “b”, inciso III, do art. 94 da Lei nº 11.101/2005, isto é, com base em duplicata fraudada:

Falência. Pedido com fundamento no art. 94, inciso III, letra "b" da Lei nº 11.101/2005. Alegação, da autora, de que a ré simulou ao ceder duplicatas sem lastro em operação de "factoring". Conduta não caracterizadora de ato de falência. Subsequente confissão de dívida englobando os mesmos títulos cedidos, ademais, que acabou por operar a novação, de modo que as obrigações cambiárias da cedente restaram quitadas. Improcedência da ação mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1009344-71.2018.8.26.0320; Relator (a): Araldo Telles; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Limeira - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 06/10/2020; Data de Registro: 13/10/2020)

Advertiu o desembargador relator que, com a assinatura dos instrumentos de confissão de dívida (fls. 60/61 e 176/178), que tinham por objeto suprir o déficit dos títulos não performados, operou-se a novação, de modo que as obrigações cambiárias da cedente/confitente foram quitadas e não autorizam, mais, pleitear a falência com sustento em suposto ato de falência”.

Então, cabe sempre referir que todas as ilações relativas à confissão de dívida podem ser contratadas, mas sempre prevalecerá a sua natureza jurídica de novação, em que o passado é esquecido e substituído por uma nova dívida.

Não conseguimos viver em dois mundos: manter vivos fatos e documentos que nos são favoráveis, e de outra banda, constituir um título executivo extrajudicial em desfavor do cedente.

Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.

(Publicado em 15/10/20)

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