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Reacendendo as discussões sobre o tema, relevante o julgado em comento, porquanto fala exatamente de situações que ocorrem com muita frequência, em especial a confirmação dada pelo sacado, que recebeu a mercadoria, mas posteriormente devolve a mesma ao cedente, negando o pagamento.
Pois o TJSP interpretou o art. 294 do Código Civil, que estabelece que: “O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente”
Observem a clareza da Lei: a oposição deve ser feita no momento em que o devedor teve ciência da cessão, e não posteriormente. Ora, se confirmou que recebeu as mercadorias, compromete-se perante a cessionária.
Vejamos:
Ação declaratória de inexigibilidade de três duplicatas – Compra e venda mercantil - Títulos que foram negociados pela corré emitente com a corré-reconvinte mediante cessão de crédito – Autora-reconvinda que, posteriormente, devolveu o produto à corré cedente dos títulos em razão de alegado "defeito de qualidade" - Fato que não pode ser oposto à corré-reconvinte, cessionária de boa-fé - Devolução que ocorreu depois de a autora-reconvinda haver sido cientificada da cessão – Impossibilidade de oposição ao cessionário das exceções que a devedora possa ter com o cedente posteriormente à notificação e anuência com a cessão de crédito operada – Inteligência do art. 294 do CC – Autora-reconvinda que, a despeito de haver anuído com a cessão de crédito realizada, não cuidou de cientificar a corré-reconvinte da posterior devolução da mercadoria - Decreto de procedência da ação principal em relação à corré-reconvinte que não se legitimava – Sentença reformada parcialmente, julgando-se improcedente a ação principal em relação à corré-reconvinte, bem como procedente a reconvenção por ela ofertada, a fim de se condenar a autora-reconvinda no pagamento do crédito representado pelas duplicatas objeto do pedido principal – Apelo da corré-reconvinte provido. (TJSP; Apelação Cível 1006503-46.2016.8.26.0006; Relator (a): José Marcos Marrone; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional VI - Penha de França - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/01/2021; Data de Registro: 26/01/2021)
Sobre a comunicação, devidamente respondida pelo sacado, via e-mail, assim considerou o Relator “A cessão de crédito envolvendo as duplicatas mercantis objeto da ação foi, sim, devidamente comunicada à autora-reconvinda em 28.1.2016, via “email” dirigido ao departamento financeiro da empresa, que não só confirmou o recebimento da missiva como manifestou expressa anuência com a cessão ocorrida em 29.1.2016 (fls. 114/116). “
E quanto aos poderes do signatário do e-mail, que não foram contestados pelo sacado: “Não podem ser colocados em dúvida os poderes da funcionária que transmitiu a anuência da autora-reconvinda com a cessão de crédito efetuada (fl. 477), quando ela própria não o fez, tendo-se limitado a justificar que, “por falta de comunicação interna da empresa”, não teve conhecimento de que tal anuência havia sido manifestada (fl. 334).”
Ainda, foi colacionado entendimento doutrinário:
Discorrendo sobre o art. 294 do Código Civil, NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY elucidam que: “O devedor, em regra, só pode opor ao cessionário, ou seja, ao adquirente do crédito, as exceções que, por sua natureza, decorrem dos direitos que acompanharam o crédito cedido e que, por isso, respeitam à causa do negócio que deu origem à cessão. Não pode opor vicissitudes supervenientes à cessão, que poderão ser estudadas no âmbito das situações jurídicas atuais, vivenciadas pelas partes, mas não respeitam ao negócio originário (...). Apesar de os direitos de formação, pela sua natureza, serem incedíveis, como já se viu (CC 286), o devedor tem o direito de poder opor contra o cessionário o direito de resolução do negócio, desde que o incumprimento tenha ocorrido antes da cessão (...)” (“Código civil comentado”, 5ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, nota 2 ao art. 294 do CC, p. 417)
Então, o sacado que confirmou o recebimento da mercadoria, mesmo que a devolva, segue responsável perante a cessionária. Caso tivesse alguma exceção, deveria fazer no ato da ciência da cessão, e não tardiamente.
Integra do julgado ao dispor dos nossos Associados, mediante login e senha.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.
(Publicado em 28/01/21)