Sempre atento para a prova, ou ao menos a declaração do vício – mesmo na confissão de dívida

Publicado em 02/12/2021

Por Alexandre Fuchs das Neves

 

Recentemente falamos sobre a necessidade da confissão de dívida descrever claramente o que ocorreu, contendo início, meio e fim. Após comentários sobre a possibilidade da confissão de dívida ser autônoma e independente, reafirmamos que, mesmo diante de uma eventual autonomia, a confissão de dívida deve ter um motivo, uma origem, e avançando, esta origem deve ser lícita (nula, pois, uma confissão de divida de jogos de azar, por exemplo).

E reafirmamos que existe uma enorme diferença entre títulos que não performaram, e por conta disso são imprestáveis para que cobrarmos o sacado, e títulos fraudulentos e simulados, não havendo qualquer motivo para não fazer constar na confissão de dívida os motivos da sua existência. Esta é uma das funções do consultivo jurídico: orientar com base em jurisprudência, ou seja, como o Poder Judiciário interpreta determinados contratos.

Retornando ao tema, vejamos um caso pontuado, onde não houve a clara declaração das partes de que os recebíveis não tinham condições de serem cobrados dos sacados, e por conta disso não estavam as partes contratando a confissão de dívida – e por conta disso o regresso, com base em mero inadimplemento (grifo nosso):

 

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. Embargos à execução. Sentença de procedência, para extinguir a execução, com fulcro no art.485, VI, do CPC. Irresignação da parte embargada. Descabimento. Confissão de dívida emitida em função de contrato de fomento mercantil que previu a responsabilidade da faturizada pela eventual inadimplência dos devedores dos títulos cedidos. Transferência do risco, através de cláusula 'pro solvendo', que é contrária à natureza da operação de factoring. Precedentes desta E. Corte e do C. STJ. 'In casu', embora a parte exequente afirme a inexistência de lastro dos títulos objeto de cessão, a incidir a regra do art.295 do CC, certo é que a confissão de dívida executada prevê que o débito nela reconhecido provém do não pagamento das duplicatas e cheques emitidos, não fazendo qualquer menção à ausência de lastro. Parte embargada que, ademais, assegura que os títulos possuem lastro negocial, estando ausente comprovação em contrário. Sentença mantida. Aplicação do art. 252 do RITJSP. Condenação em honorários advocatícios majorada para 15% do valor atualizado da causa. Incidência da norma prevista no artigo 85, §11, do CPC. Recurso não provido. (TJSP;  Apelação Cível 1020546-85.2019.8.26.0554; Relator (a): Walter Barone; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André - 9ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/11/2021; Data de Registro: 26/11/2021).

 

Então bastava fazer constar na confissão de dívida a ausência de lastro, ou seja, a não performance do título, para que fosse suficiente o julgamento no sentido contrário. Neste sentido, reafirmamos a orientação: confissão de dívida deve constar a origem clara a dívida e, em especial, quando for o caso, a ausência de lastro nos recebíveis recomprados.

 

Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.

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