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Modernamente, diante de milhares de pedidos de recuperação judicial que assoberbam o Poder Judiciário, tem virado praxe das empresas e seus operadores (advogados e administradores judiciais) pedir, em flagrante má-fé, que sejam devolvidos os títulos performados negociados (comprados pela fomento), vencidos após o pedido de recuperação judicial.
Ao juízo da recuperação judicial é ofertado pedido neste sentido, alegando, de maneira astuta, que o contrato de fomento mercantil não será devidamente registrado, e tampouco as duplicatas negociadas estão com a devida garantia fiduciária constituída, fazendo o juízo crer que estamos diante de contrato de mútuo com caução fiduciário de duplicatas, em que seria aplicado o art. 49, § 3º, da Lei de Recuperação de Empresas.
Apenas para explicar, se não houver o registro fiduciário da garantia na referida modalidade contratual, perde o credor o direito à chamada “trava bancária” e, de fato, tem que estornar todas as duplicatas negociadas, por eventual falta de cumprimento da regra, e deve habilitar seu crédito como quirografário.
Mas esta não é a modalidade em que atuamos!
Nosso contrato é de compra de ativos (endosso a título definitivo), não podendo ser aplicada a norma em comento.
Tanto é que o SINFAC-SP, desde o início de 2015, prevendo a enxurrada de novas recuperações judiciais, assim como a atitude nefasta dos cedentes, alterou seu contrato-matriz, para que fique clara a operação: uma vez pago o aditivo, as duplicata passam a ser de propriedade plena da fomento, saindo do balanço da empresa cedente, que não tem mais qualquer ingerência sobre elas.
E o TJ-SP, instado a decidir sobre o tema, bem explanou no Agravo de Instrumento 2003524-15.2016.8.26.0000, no qual o relator, desembargador Eio Zuliani, bem descreveu a nossa atividade:
No caso dos autos se está diante de verdadeira compra dos créditos (função de garantia do factoring), não se podendo equiparar as faturizadoras às instituições financeiras com títulos em garantia.
A recuperanda não apresenta qualquer evidência de sido firmado instrumentos conferindo aos faturizadores com quem contratou a qualidade de proprietário fiduciário dos títulos entregues em troca de dinheiro.
Segue o relator, falando sobre a necessidade de segurança jurídica na nossa atividade:
E se assim o é, não se mostra razoável surpreender o faturizador, tratando o contrato por ele firmado como mútuo garantido por cessão fiduciária de títulos de crédito.
Nessa esteira, pode-se dizer não serem aplicáveis aos contratos firmados pela recuperanda com faturizadoras o art. 49, § 3º, da LRF, o art. 1.361, §1º, do Código Civil ou as súmulas do TJ-SP nº 60 e 62.
E, considerando que a fomento pagou pela compra das duplicatas, determinar que o valor das mesmas seja devolvido, e crédito habilitado como quirografário é, com efeito, permitir a locupletação indevida, como bem reconhecido no corpo do julgado:
Tanto é verdade que, após a apresentação de manifestações nos autos, o juiz monocrático, em sede de juízo de retratação, ponderou que não havia, mesmo, de se falar em devolução dos títulos à agravante, porque demonstrada a inexistência de “mera cobrança de títulos ou de mera operação com títulos em garantia, já que há notícias e comprovação de pagamento pelos mesmos, indicando que a medida liminar deferida contribuiria em muito para a locupletação ilícita da recuperanda” (grifo nosso).
Pois bem, o problema gera exatamente a necessidade de as empresas em manter os seus contratos atualizados, para que as cláusulas referidas sejam apontadas, vistas e conhecidas, de pronto, pelo juiz da recuperação judicial, deixando extreme de dúvidas como funciona a nossa atividade.
De outro lado, cabe alertar para que o empresário, diante de uma situação análoga, não demore a tomar as decisões de crédito e adotar o remédio jurídico cabível (agravo de instrumento), dentro do prazo previsto.
Veja a integra do julgado mediante login e senha, no menu Legislação/Jurídico / Julgados.
Alexandre Fuchs das Neves é advogado e consultor jurídico do SINFAC-SP – Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo.