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Publicado em 09/04/2020

Como é o home office dos presidentes de grandes companhias (Estadão)

Acostumados ao rigor do ambiente corporativo, com reuniões, viagens e uma extensa agenda de encontros de negócios, presidentes de grandes empresas do País também estão tendo de recriar suas rotinas frente à pandemia do coronavírus e a necessidade de isolamento social.

Distantes da estrutura dos escritórios e dividindo o espaço de trabalho agora com a família, esses executivos fizeram dos aplicativos de videoconferência o principal instrumento de trabalho.

Pela tela do computador ou do celular, eles comandam milhares de funcionários e muitos estão à frente de empresas de áreas consideradas essenciais, que não podem falhar principalmente em momentos como esses, como serviços de telecomunicações, água, energia elétrica e alimentação. Também passam boa parte do dia em reuniões com governantes, representantes do setor e outros executivos da empresa.

As telas não resolvem só as questões de trabalho. Nas últimas três semanas, praticamente tudo tem sido feito por vídeo. Das aulas de atividade física e de relaxamento às sessões de terapia. Habituados, em geral, a ficar pouco tempo em casa, os executivos estão também abrindo espaço na agenda para compromissos menos usuais, como auxiliar os filhos nas atividades escolares ou dividir os cuidados com a casa.

Apesar das dificuldades - de relatarem a falta do “olho no olho” nas relações de trabalho ou carga horária mais pesada - muitos têm visto a experiência como um aprendizado forçado e repensado a forma de se trabalhar. A volta para o escritório promete ser diferente. Conheça o dia a dia dos presidentes das empresas no isolamento social

É de um sítio, no interior de São Paulo, que o presidente da Vivo, Christian Gebara, tem comandado seus 33 mil funcionários nas últimas três semanas. Ali, distante 100 quilômetros (km) da capital paulista, ele divide o dia entre videoconferências com executivos da companhia, clientes, governantes e representantes do setor e as tarefas escolares dos dois filhos, de 12 e 14 anos. “Aqui no campo, no meio do nada, as crianças têm mais espaço do que se ficassem em São Paulo dentro de um apartamento.”

Acostumado ao ritmo acelerado da Avenida Berrini, onde fica a sede da empresa em São Paulo, ele tem procurado manter uma rotina de disciplinas, com exercícios físicos antes de iniciar o trabalho e paradas para o almoço em família.

Antes de iniciar as atividades, ele corre e faz aulas com um personal por vídeo. As reuniões começam por volta das 8h30 da manhã e prosseguem até às 20h30. Pelo menos duas delas, é para discutir os efeitos do coronavírus com o pessoal da empresa e com clientes. Depois, ao longo do dia, vem outras conversas, de caráter mais institucional, para tratar de medidas de ajuda ao setor. “Estou trabalhando igual ou mais do que o normal, mas estamos tentando manter a empresa funcionando”, diz Gebara.

Segundo ele, as reuniões por videoconferência e o fato de não ter de se locomover para o trabalho geram uma produtividade maior. “Por outro lado, sinto falta do olho no olho; numa conversa pessoalmente você consegue perceber coisas que são mais difíceis de verificar por vídeo.”

Na terceira semana em home office, o presidente da Eletrobrás, Wilson Ferreira Junior, conta que tem feito cerca de dez reuniões por dia. O início do isolamento social do executivo culminou com o prazo de entrega dos balanços da estatal e de suas subsidiárias, o que exigiu uma dinâmica diferente do habitual. “Foi um grande desafio soltar todos os balanços até 30 de março por trabalho remoto. Usamos até o último minuto.”

O executivo está em home office em sua casa em Campinas, no interior de São Paulo, com a mulher e a filha de sete anos. Por causa dos riscos de contaminação, ele e a mulher dispensaram a empregada e todas as atividades domésticas têm de ser feitas pelo casal.

“Minha mulher tem ajudado bastante. Ela faz praticamente tudo. Trabalha, cuida da criança e cozinha”. Para contribuir com a arrumação da casa, Ferreira Junior ficou responsável por lavar a louça do jantar. “É a primeira coisa que eu faço no dia.” Por volta das 8 horas da manhã, ele inicia suas atividades de trabalho e fica o dia inteiro atendendo celular, respondendo WhatsApp e participando de reuniões por vídeo. “Nunca usei tanta ferramenta de TI (tecnologia de informação) como agora. Estou impressionado como esses sistemas estão nos ajudando.”

A rotina de trabalho, normalmente, termina por volta das 20h30, quando ele consegue jantar com a família. Ferreira Junior afirma que depois de três semanas trabalhando sozinho num escritório, começa a bater uma certa solidão. Para tentar levantar o ânimo, uma das alternativas têm sido marcar reuniões virtuais com os amigos. “Na última semana, fizemos um Zoom (aplicativo que permite reunir uma série de pessoas ao mesmo tempo em videoconferência) com amigos e cada um tomando o seu uísque preferido. Foi praticamente uma terapia em grupo.”

À frente da plataforma de vendas online OLX, Andries Oudshoorn já estava acostumado com o home office eventual e as teleconferências. Mas fazer isso junto com todos os outros 800 funcionários ao mesmo tempo não é uma tarefa fácil, reconhece o executivo. “Fazemos reuniões semanais com todos os trabalhadores para tentar diminuir a ansiedade pela qual eles estão enfrentando.”

Ele está em isolamento em seu apartamento no Rio de Janeiro com a esposa e os dois filhos, que fazem diariamente aulas online. Apesar da demanda maior por decisões, ele afirma que o trabalho em casa tem sido mais flexível que a jornada no escritório.

“Começo o trabalho as 8 horas e vou até umas sete da noite. Mas consigo parar para fazer algumas atividades com a família”. Ele consegue reservar tempo na agenda para cozinhar e para acompanhar algumas aulas online dos filhos. Antes de iniciar as atividades da empresa, também consegue correr e fazer musculação para reduzir o estresse. “Tem sido muito produtivo, pois não perco tempo em avião ou em locomoção de um lado para outro.”

O executivo destaca, entretanto, que há alguns pontos negativos. Ele reclama da qualidade da internet, que considera ruim, e da falta de contato com as pessoas. “Algumas conversas mais sensíveis, acho melhor ter pessoalmente do que por telefone ou por videoconferência.” No dia a dia, diz ele, é difícil estabelecer uma conexão emocional com as pessoas remotamente.

O lado positivo é que, depois dessa experiência e dos bons resultados em relação à motivação, coletividade e produtividade, será mais fácil contratar profissionais espalhados pelo Brasil. “Engenheiro de software, por exemplo, é um profissional mais difícil de se encontrar, mas se puder contratar em qualquer lugar do Brasil isso fica mais fácil.”

Uma das primeiras providências da presidente da empresa de crédito Captalys, Margot Greenman, foi liberar uma mesa para trabalhar com os dois filhos em casa. De um lado, está seu notebook. Do outro, uma série de materiais escolares, como lápis de cor, giz de cera e tesoura. “Tenho colocado eles para fazer projetos de arte enquanto faço minhas atividades”, diz ela, que liberou a babá nesse período. “Mas, quando tenho muitas coisas para fazer, peço uma ajuda para ela.”

Margot começa sua rotina entre 5 e 6 horas da manhã, antes de as crianças acordarem. Aproveita o momento para responder e-mails e fazer trabalhos que exigem mais silêncio.

Em seguida, faz o café da manhã e coloca os filhos para iniciar alguma atividade. “Quem está com crianças em casa sabe que esse é uns dos maiores desafios da situação atual.”

As ligações e reuniões com a equipe começam às 9 horas. O período da tarde ficou reservado para interações com clientes. E, no fim da noite, quando as crianças vão dormir, ela volta para o trabalho. Margot confessa que não tem sido fácil. “É uma disciplina diferente, uma novidade. Somente agora, depois de duas semanas, estou conseguindo retomar o foco nos assuntos estratégicos que estavam sendo tocados antes da crise.”

Na avaliação de Margot, o mundo já começa a viver uma mudança profunda. O home office forçado tem mostrado que é possível fazer muito mais com uma produtividade maior, afirma. “Quando sairmos dessa crise, teremos uma redução brutal de custos e novas formas de atender e fazer coisas mais eficientes.”

O home office tem sido um momento de redescobertas para a presidente da empresa de saneamento básico BRK Ambiental, Teresa Vernaglia. “Há anos não conseguia sentar para almoçar e jantar com a família como estou fazendo agora. Esse momento tem sido bem bacana”. Outra redescoberta, brinca Teresa, é a dispensa da casa.

Com a empregada também em isolamento, ela tem revezado com a família os afazeres domésticos. “Minha rotina tem começado às 6 horas da manhã e, algumas vezes, vai até a 1 hora da madrugada”, diz Teresa. Com 1.400 funcionários em home office, os cuidados para garantir o abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto tem de ser maior, apesar de as equipes de operação estarem trabalhando normalmente.

“Criamos um comitê de gestão de crise para garantir que os serviços não sejam interrompidos”, diz ela, que também contratou uma profissional para tratar da saúde mental dos funcionários e líderes da empresa. Teresa diz que passa maior parte de seu tempo em reuniões, seja da empresa ou com o governo e entidades do setor.

Neste momento, há uma grande preocupação sobre o impacto que a pandemia terá na economia do País e da empresa já que muitas famílias não terão condições de pagar suas contas. “Temos de tratar desse assunto agora, uma vez que a crise afeta a liquidez da companhia”, diz Teresa, que acredita que o coronavírus mostrará para a sociedade a importância de se investir em saneamento no País. Hoje, apesar das recomendações de higiene, cerca de 35 milhões de pessoas sequer têm acesso à água potável.

O presidente do Nubank, David Vélez, escolheu fazer o isolamento social numa casa no interior do Estado de São Paulo. Ali, sem uma estrutura preparada para o home office, ele faz o que pode para cumprir sua extensa agenda de reuniões e demais atividades. “Atendo às chamadas durante o dia na sala de estar, mesa de jantar ou em cima da minha cama”.

As conversas por telefone também costumam ocorrer durante as caminhadas de Vélez. “É ótimo para me exercitar e também me ajuda a pensar com mais clareza e calma nas decisões a serem tomadas neste período.” O executivo conta que, por ter escritório em outros países, já estava acostumado a trabalhar onde fosse necessário, seja em casa, avião, aeroporto ou café.

“Os times do Nubank também sempre viveram essa realidade. Agora ter 100% dos funcionários trabalhando remotamente foi algo inédito mesmo. Tem sido um aprendizado.”

Vélez conta que tem tentando manter uma rotina semelhante a que tinha antes da pandemia. Ele acorda por volta das 5h30 com o filho de 3 anos, que desperta cedo. “Como uma tigela de cereal com ele e faço exercícios por cerca de uma hora todos os dias.” Por volta das 8h30, ele começa a receber chamadas e entra em reuniões que vão até às 20 ou 21 horas. “A vantagem é que estou vendo meus filhos e minha esposa o tempo todo e consigo fazer as refeições com eles.”

O executivo diz que, apesar de sempre trabalhar muitas horas por dia, as últimas semanas têm sido mais longas que o habitual. Para ele, no pós-pandemia, o home office deve crescer consideravelmente. Isso vai aumentar o acesso a talentos de uma maneira mais global. “Uma sociedade mais digital é também mais produtiva, porque exige uma estrutura de custos mais baixa e torna a vida de clientes e empresas mais econômica e prática.”

O presidente da CCR, Leonardo Vianna, se diz um executivo antigo, de outra geração. Sempre teve um pé atrás com o home office. Mas o isolamento forçado tem feito o executivo mudar de ideia. “As reuniões estão ocorrendo por videoconferência e têm dado muito certo. Então vamos repensar a forma de trabalhar”, diz o executivo.

Na avaliação de Vianna, a experiência de agora vai mudar a maneira de as empresas trabalharem. “Vemos que muita coisa pode ser resolvida por meio de reuniões virtuais em vez de ter de fazer uma viagem, por exemplo.” Para Vianna, as empresas vão ganhar agilidade, economia e produtividade com esse processo. Ele conta que está em isolamento social desde o dia 16 de março.

De lá para cá, o volume de trabalho aumentou bastante. Todos os dias, às 10 horas da manhã, ele reúne a diretoria numa videoconferência para tratar dos assuntos da crise. Por administrar rodovias importantes para o transporte nacional, a empresa criou um gabinete de crise para acompanhar tudo que está ocorrendo nas concessões e possíveis medidas que precisam ser tomadas para sanar algumas deficiências. A CCR tem a concessão de 12 rodovias e 5 aeroportos no Brasil e no exterior, além de concessões na área de mobilidade urbana.

Apesar da relutância inicial, Vianna tem gostado dos resultados do home office. “Em casa você fica mais descontraído e tem mais flexibilidade. Estamos iniciando uma prática que veio para ficar.”

Com quatro filhos em casa, o presidente da Tecnisa, Joseph Nigri, decidiu passar boa parte do isolamento social em sua casa de praia. Como as crianças estão tendo aulas online, separou um cômodo da casa para se dedicar às atividades da empresa.

Desde que começou o home office, uma vez por semana faz uma live (vídeo ao vivo) com todos os gerentes e outra para todos os 200 funcionários do escritório. “Eles fazem perguntas no chat e eu respondo. Todo mundo quer saber o que fazer.” Segundo Nigri, o tempo tem sido mais bem aproveitado nas videoconferências. Pessoalmente, diz ele, as reuniões são muito longas. O executivo tem procurado fazer uma hora por dia de atividades físicas com vídeos gravados por um personal.

Os exercícios, diz ele, ajudam a reduzir o estresse neste momento mais delicado e com tantas incertezas em relação ao que vem pela frente, seja do ponto de vista de saúde ou econômico, que devem impactar o resultado da empresa. Outra dica que ele tem seguido à risca é não ficar de pijama o dia todo. “Mas coloco uma roupa mais confortável.”

Na avaliação do executivo, um dos principais desafios tem sido conciliar o tempo de trabalho com as crianças em casa. “Com os filhos também em isolamento, a dinâmica é outra.” Segundo ele, algumas reuniões são marcadas em horários alternativos para não ter a interferência das crianças.

O home office nunca foi uma prática para o presidente da BRF, Lorival Luz, apesar de a empresa ter um programa de trabalho remoto há algum tempo. “Gosto de ficar com as pessoas e interagir”, diz o executivo, que comanda 90 mil funcionários no Brasil e no exterior.

Luz está em casa desde o dia 12 de março, antes de o governo decretar o isolamento social em São Paulo. Ele conta que a primeira semana foi mais intensa uma vez que os governos começaram a anunciar as medidas – a empresa tem 34 complexos industriais em 10 Estados brasileiros e 5 fábricas fora do País. “Teve dia que comecei às 7 horas e fui até uma hora da madrugada em reuniões para tentar resolver os problemas.”

A rotina do executivo começa às 5:45 da manhã. “Acordo, tomo café, faço uma hora de esteira, tomo banho e às 7h15 já estou sentando para ler jornal e responder e-mails”, diz Luz. Depois começam as reuniões em videoconferência. São duas por dia com as 60 lideranças da empresa, uma de manhã e outra no início da noite. Depois vem as reuniões com representantes do setor e autoridades. “Além disso, temos mantido as reuniões de diretoria às segundas-feiras.”

Na maior parte do tempo, fica trancado em seu escritório, onde tem a sua disposição dois Ipads, um computador e uma televisão ligada o tempo todo. O executivo está em isolamento em sua casa em São Paulo, com os dois filhos e a esposa. “Ninguém sai de casa.”

Uma das conclusões de Luz durante esse isolamento social é que muita coisa vai mudar na empresa após o fim da pandemia. “Antes ia a uma reunião no Paraná ou no Rio e perdia o dia inteiro. Acho que as pessoas vão entender que, em algumas situações, a videoconferência vai funcionar. Quem vai sofrer é o turismo de negócios.”

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