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Publicado em 14/05/2019

Fundo de crédito avança e acende alerta sobre liquidez (Valor Econômico)

Os fundos de investimento que se dedicam a comprar títulos de crédito privado estão em alta, mas especialistas mostram alguma preocupação com o fato de eles estarem se expandindo em bases que não são as mais adequadas.

A maior parte das carteiras que surge oferece aos investidores liquidez imediata. Ou seja, após um pedido de resgate, o pagamento dos recursos é feito no mesmo dia da solicitação ou no dia seguinte. A indústria cresce assim apesar de o mercado secundário, onde esses papéis são negociados, ter liquidez ainda bastante reduzida, trazendo risco para o gestor que precisar vender os títulos para honrar resgates.

Essas carteiras investem em títulos de dívida corporativa, principalmente debêntures. São papéis que prometem o pagamento de rendimentos mensais por um prazo cada vez mais longo, mas o investidor está entrando na aplicação com a cabeça de liquidez imediata.

Um levantamento feito pela Quantum Axis, a pedido do Valor, mostra que fundos que têm na carteira entre 50% e 60% de crédito privado somam hoje patrimônio de R$ 32,3 bilhões e 72% desse total está em produtos com resgate em até um dia. No caso dos fundos que destinam entre 60% e 70% para dívida corporativa, do patrimonio total de R$ 118,3 bilhões, 81,5% estão em opções com resgate imediato. Quando a participação dos títulos sobe um pouco mais, o percentual reduz, mas ainda é relevante. Para os fundos que mantêm em carteira entre 70% e 80% de crédito privado, do patrimônio de R$ 36,3 bilhões, metade (52,5%) está em portfólios que oferecem o resgate imediato.

O estudo da Quantum Axis leva em consideração fundos que possuem o termo "crédito privado" em sua razão social e que não são restritos, ou seja, não se destinam exclusivamente a um único cotista. Por conta da regra que permite aos fundos omitir a carteira por até 90 dias, o retrato acima é da composição dos portfólios em dezembro de 2018.

Jean-Pierre Cote Gil, sócio responsável pela gestão de crédito na GPS Investimentos, está entre os que mostram preocupação com esse aspecto do forte crescimento desses fundos. "Regras de resgate muito flexíveis atraem investidores de curto prazo, geralmente mais voláteis. Portanto, a baixa liquidez de ativos de crédito pode se virar contra o próprio gestor sob um cenário de estresse", afirma Cote Gil.

A massa de novos investidores desses fundos é de pessoas físicas que estão trocando o atendimento dos bancos pelas opções das plataformas abertas, num movimento de busca por diversificação em um ambiente de juro baixo. A preocupação de alguns gestores é que esse investidor talvez não entenda o que está comprando. O mercado está com uma superoferta de debêntures e com viés favorável ao emissor, o que equivale dizer que os rendimentos dos títulos estão caindo e os prazos dos papéis aumentando.

"Se outro investimento de que a pessoa física gosta, como os IPOs (ofertas públicas iniciais de ações), voltar com aquela força do passado, a minha sensação é que uma boa parte desses investidores resgata dos fundos de crédito e migra para os IPOs em busca de um retorno melhor", explica uma fonte. Esse tipo de movimento poderá atrapalhar a estratégia dos gestores e levar perdas às cotas dos fundos se eles tiverem de vender títulos "a qualquer preço" para atender aos pedidos de resgates.

Samuel Oliveira, chefe de análise de fundos da XP Investimentos, avalia que as pessoas físicas que entram nesses fundos de crédito estão buscando um produto com um retorno mais favorável do que vinha encontrando nos grandes bancos. "É um tipo de fundo que oferece uma relação favorável de risco e retorno para esse investidor que está deixando os bancos para testar novos produtos. Ele primeiro testa isso, para depois olhar, por exemplo, para ações", diz Oliveira.

Na plataforma da XP, segundo ele, existe uma regra: para que um fundo de crédito privado com resgate diário seja oferecido é preciso que ele mantenha entre 30% e 40% dos recursos em "caixa". Ou seja, essa fatia do fundo precisa estar investida em papéis que ofereçam liquidez imediata, como títulos públicos ou operações compromissadas. E o restante, que vai para os títulos de crédito, tem que buscar papéis que tenham liquidez comprovada no mercado secundário.

É fato que, nos últimos dois anos, as negociações com esses títulos no mercado secundário brasileiro têm aumentado. Mas um aspecto importante é que as transações desses títulos corporativos não são feitas em ambiente de bolsa, mas sim "no balcão". Na prática, isso significa que não há a todo momento o registro de várias ofertas de compra e venda de um ativo, com total transparência de preços. Atualmente, há esforços de alguns agentes no mercado, como a XP e a CM Capital, para concentrar ordens de compra e venda de investidores e fazer essas duas pontas se encontrarem.

Um gestor de um banco local acredita que, para que se possa fazer uma gestão com tranquilidade nesse tipo de fundo, é preciso um prazo de resgate de, no mínimo, 30 dias. O ideal, ele diz, seria pelo menos 60 - várias casas maiores estão migrando para esse prazo. Outras, diante dos retornos menos atrativos e prazos mais longos dos papéis atualmente, optaram por fechar para captação. "Do meu ponto de vista, quem oferece resgate diário é porque está contando com o mercado secundário desses títulos. O dia em que tiver dificuldades, vai ser um problema", afirma o gestor, destacando que uma eventual crise no segmento poderá machucar muitas casas.

Outra questão que pode ser relevante, segundo esse interlocutor, é que alguns gestores de crédito que abriram sua própria empresa não estão acostumados a lidar com o investidor do varejo, porque trabalhavam em mesa proprietária de banco, com um passivo que ele controlava, que não se mexia tanto. "Não é o caso quando se fala de fundos dedicados ao varejo. Talvez antes de investir, seria interessante verificar se esse gestor administrava no banco fundos ou recursos proprietários", afirma.

Alexandre Muller, sócio da JGP Investimentos, argumenta que quem está nesses fundos tem que ter em mente que o investimento em crédito é, por definição, cíclico. Há momentos de expansão, como o atual, mas que são sempre seguidos por uma fase de retração, quando costumam aparecer os problemas. Por essa razão, a opção da JGP foi por não oferecer o resgate imediato.

"Preferimos uma carência mais longa porque, na nossa visão, a geração de valor nesses fundos é possível pelo diferencial do passivo [cotistas]. Eu prefiro ter o conforto de que meu cotista não vai sair solicitando resgates em momentos de ajuste do ciclo de crédito porque ele entende que deve esperar pelo trabalho do gestor e por um novo ciclo", afirma.

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