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Publicado em 13/08/2019

Investidores processam Grupo Bitcoin Banco após 2 meses de saques bloqueados; pedidos superam R$ 70 milhões (Valor Econômico)

O Grupo Bitcoin Banco (GBB), dono de plataformas de negociação de criptomoedas, está há mais de dois meses sem apresentar uma solução concreta para milhares de clientes que não conseguem sacar de suas contas, seja em reais ou em criptoativos.

Enquanto isso, os processos judiciais se multiplicaram em grande velocidade cobrando a empresa e seu dono, Claudio Oliveira, que até maio se promovia como “o rei do bitcoin”.

Neste momento, os prejuízos são incalculáveis, mas é possível estimar, pelas declarações de clientes lesados ouvidos pelo Valor Investe, que alcançam centenas de milhões, quando somado o valor inicial aplicado pelos investidores mais os lucros que eles viam em suas posições nas plataformas.

Com sede em Curitiba (PR), o grupo, que tem as plataformas NegocieCoins e TemBTC, tornou-se alvo de, pelo menos, mais de 100 processos judiciais em diversos Estados do país, que cobram um valor somado superior a R$ 70 milhões, segundo o advogado paranaense Gustavo Bonini Guedes, que atende dois grupos de famílias que não conseguem resgatar seus recursos.

Ele explicou, contudo, que há diversos outros casos em segredo de Justiça e sobre os quais não é possível estimar os valores cobrados — segundo investidores, o sigilo teria sido solicitado por Oliveira, o fundador do GBB.

Desde o início dos problemas, no fim do mês de maio, Oliveira tem prometido sanar a situação em vídeos e áudios que circulam nos diversos grupos de conversas, nos aplicativos WhatsApp e Telegram, de clientes prejudicados.

Em um dos primeiros a circular, ainda em maio, o empresário diz “que é homem suficiente para dar as caras”, que está em busca de uma saída e que a explicação para as dificuldades está no fato de os saques estarem ocorrendo de forma “manual”, e não automatizada.

A mais recente gravação, um áudio, é do fim de semana. Durante quase sete minutos, o empresário admite a continuidade dos problemas com os saques e diz trabalhar em uma solução, mas sem especificar qual.

Na mensagem, argumenta que os problemas foram ampliados pelos próprios pedidos de saques e pelos clientes que levaram a situação à Justiça, o que gerou diversos bloqueios de contas e patrimônio.

A situação chegou a tal ponto que alguns investidores promoveram protestos no sábado (10) e nesta segunda-feira (12) na frente da sede do grupo empresarial, em Curitiba.

Um porta-voz da controladoria do GBB afirmou ao Valor que o grupo está solicitando prazo de mais 30 dias para solucionar a situação e que os saques estão limitados, nesse período, a R$ 10 mil ou 0,25 bitcoin por cliente.

O grupo congelou as contas após alegar ter sofrido uma fraude de R$ 50 milhões.

Na ocasião, segundo o próprio GBB, foi descoberta uma fragilidade por meio da qual um usuário poderia fazer saques simultâneos — se estivesse plugado à plataforma em mais de um dispositivo.

Na mesma época, o Brasil Plural, titular da conta da NegocieCoins, cancelou a conta bancária da "exchange".

Consultada, a instituição informou que, “após questionar as movimentações da NegocieCoins e não receber os esclarecimentos satisfatórios”, encerrou imediatamente qualquer relacionamento comercial. O Brasil Plural afirmou que o GBB “está expressamente proibido de utilizar o nome do banco” e que "não possui qualquer controle ou envolvimento sobre o sistema de negociação de criptomoedas”, feito diretamente na plataforma.

Ao Valor, o porta-voz do GBB afirmou que há três problemas concomitantes hoje: a falta de uma conta bancária para movimentação, desde o cancelamento do Brasil Plural, o congelamento das posições de bitcoin do GBB após a fraude (o que, segundo a empresa, foi feito para que fosse realizada uma auditoria) e os processos judiciais.

Segundo ele, a dificuldade de abertura de conta se deve ao “desinteresse comercial” dos bancos.

Ao Valor, o GBB afirmou, por meio do seu representante de marketing, que tem 400 mil clientes cadastrados e 50 mil ativos. Entretanto, não quis fornecer qual o montante está preso em suas plataformas de negociação. Também alegou que não poderia comentar como vai solucionar o que está em juízo por serem discussões protegidas por segredo de Justiça.

Como resposta às consultas da reportagem, o grupo afirmou ter pago a clientes mais de R$ 100 milhões desde o início da crise, mas não informou quanto totalizam os pedidos de resgates hoje.

Há diversos relatos segundo os quais Oliveira fez acordos com os clientes (com confissões de dívidas em âmbito extrajudicial, em alguns casos), pagou o sinal (um percentual abaixo de 10%) e não honrou o restante do compromisso.

É o caso de um dos clientes do advogado Gustavo Bonini Guedes. As causas que ele representa somam R$ 11 milhões. Como não foram pagos os acordos, ele iniciou uma ação de execução no valor de R$ 13 milhões, que inclui multas e sucumbências.

Foi assim também com Diego André Martins, empresário de Santos que é sócio de uma consultoria chamada Work. Em fevereiro, ele e um sócio investiram R$ 5 milhões para negociar no GBB, entre recursos deles e de clientes da empresa.

Em poucos meses, Martins viu o valor de seus investimentos disparar para R$ 39 milhões. Mas, diante dos problemas, assim como outros clientes, disse ter sido convencido por Oliveira a não fazer saques volumosos, para não agravar o problema de liquidez — algo de que o dono do GBB se diz vítima e vem chamando de “terrorismo”.

Especialistas afirmam que plataformas de negociação não deveriam sofrer problemas de liquidez, pois os recursos são sempre dos clientes — em criptomoedas ou em dinheiro.

Em junho, Martins aceitou um acordo proposto pelo empresário para quitar a dívida por R$ 12 milhões, em três parcelas. Porém, o empresário não cumpriu nem com a primeira. Foi quando a Work resolveu ir à Justiça.

Empresário foi "rei do bitcoin" até maio

Oliveira, que agora se coloca como vítima, vinha se promovendo como dono da plataforma líder mundial em volume, a NegocieCoins. Mas não há como garantir que o volume, de fato, ocorreu.

O ranking mais conhecido é do site CoinMarketCap, com duas classificações. Em uma delas, quem declara o quanto negocia é a própria plataforma. Na outra, a CoinMarketCap ajusta o total após verificações. A liderança da NegocieCoins era no volume que ela mesma relatava.

Na sexta-feira, no CoinMarketCap, a NegocieCoins aparecia na 23ª posição em volume declarado, mas não estava presente no ranking das 100 maiores pelo critério ajustado. O GBB disse que questionou o site sobre a diferença nas classificações, sem obter resposta.

As plataformas do GBB passaram a ganhar destaque a partir de uma possibilidade de arbitragem oferecida permanentemente entre a NegocieCoins e a TemBTC (diante da diferença contínua de preço do bitcoin nas duas plataformas), gerando quase um lucro certo aos clientes, o que contraria a natureza volátil e de formação de preços desse mercado.

Conforme fontes próximas ao caso, contudo, tanto a disparidade entre volume declarados e visualizados como esse mecanismos de arbitragem estiveram entre as questões que levaram o Brasil Plural a cancelar a conta.

Escândalo impulsiona regulação

As supostas fraudes e o suposto calote do GBB alertam para os riscos de um mercado volátil e que ainda está em maturação. Como sempre alertam os especialistas e as "exchanges" consideradas com mais credibilidade, qualquer investimento neste tipo de ativo deve ser estudado e o investidor precisa estar ciente dos riscos de eventuais perdas.

Segundo Gustavo Chamati, fundador do Mercado Bitcoin, a maior "exchange" do país, há em seu negócio uma grande preocupação em "deixar claros os riscos e o perfil de investidor para o qual esse tipo de investimento é adequado". "Não quero meu cliente bravo comigo, porque senão ele não volta; quero ele esclarecido, sabendo que pode eventualmente perder no curto prazo, mas também ganhar no longo prazo", diz.

Segundo ele, essa demanda por esclarecimento já vem motivando investimentos do Mercado Bitcoin em educação financeira desde 2017, ano em que uma disparada nas cotações das moedas virtuais, em particular do bitcoin, multiplicou investidores e “exchanges” no país.

“Sempre alertamos sobre a necessidade de não investir mais do que uma pequena parcela do patrimônio nisso, e também sobre a demanda por entender os riscos operacionais e de segurança na guarda das criptomoedas”, conclui Chamati, para quem a possibilidade de regulação da criptoeconomia por parte do governo brasileiro é bem-vinda, desde que previna o mau uso do mercado sem impossibilitar a tecnologia.

O caso do GBB também mobilizou os investidores lesados. Parte deles começa a se reunir em uma organização, a Associação dos Clientes de Corretoras de Criptoativos, que deve ser a primeira reunião oficial de clientes de “exchanges”. “Já temos estatuto e estamos finalizando a ata para registro da diretoria”, diz Martins, da Work Consultoria.

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