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Publicado em
17/03/2020
Os bancos, de forma geral, já estão com uma boa margem no seu capital principal em relação aos mínimos regulatórios. Por isso, não é por falta de capital que deixariam de empresar, mas por aversão a riscos. Em momentos de estresse, eles costumam procurar manter bons índices de capitalização para mostrar solidez.
As medidas anunciadas pelo CMN têm duas vertentes. De um lado, permitem que a renegociação de dívidas de famílias e empresas que tiverem dificuldades durante o surto do coronavírus não impacte os provisionamentos dos bancos. De outro, faz um alívio temporário no requerimento de capital de Basileia 3 para incentivar a continuidade do crédito.
O CMN suspendeu por seis meses uma regra que diz que os bancos devem fazer provisões se renegociarem uma operação de crédito quando consideram que o cliente não tem mais capacidade para honrar a obrigação nas condições pactuadas; ou se, nessa repactuação, concederem descontos devido à fragilidade da capacidade de pagamento do devedor ou das garantias.
Essa suspensão teve efeito quase que imediato. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) divulgou nota dizendo que os cinco maiores bancos do país estão abertos a atender pedidos de prorrogação, por 60 dias, de vencimentos de dívidas de pessoas físicas e pequenas empresas, limitados aos valores negociados.
A medida é muito importante porque evita uma alta na inadimplência nos bancos, que mais adiante poderia levar a uma restrição mais severa de crédito, além de dar um alívio de caixa para pequenas empresas e para famílias endividadas.
A outra medida anunciada pelo CMN reduz um dos adicionais de capital principal de Basileia 3 - chamado de conservação - de 2,5% para 1,25% dos ativos ponderados pelo risco, pelo prazo de um ano. Depois, o percentual será recomposto gradualmente, até marco de 2022.
Esse adicional de capital foi criado por Basileia 3 depois da crise internacional de 2008 justamente com essa função: é um colchão de capital que os bancos acumulam nos momentos em que a economia cresce, para ser usado nos períodos de forte contração.
Quando os bancos caem abaixo do nível mínimo do capital conservação, são obrigados a parar de distribuir dividendos e a suspender bônus para os seus executivos. Essa regra, temporariamente, só será aplicada se o colchão adicional de conservação cair abaixo de 1,25%.
A mudança na regra abre uma margem adicional de R$ 637 bilhões para novas operações, mas a questão é se os bancos brasileiros vão, mesmo, precisar desse colchão. Hoje, em geral, eles estão muito bem capitalizados. Para os grandes, a exigência é um capital principal básico (4,5%), mas o adicional e conservação (2,5%) e uma camada extra para o risco sistêmico (1%). No total, portanto, dá uma exigência de 8%. A regra do CMN dá uma folga de 1,25 ponto nessa exigência.
Dados do Banco Central referentes a setembro de 2019 mostram que, no geral, os grandes bancos estão com índices ao redor de 13%. A exceção é o Banco do Brasil, com um índice de 10,24%, mas mesmo assim com uma folga importante em relação ao requerimento mínimo.
A outra questão é se os bancos vão querer usar essa margem adicional para expandir o crédito. Há um debate entre especialistas sobre o quanto essas regras de Basileia 3 tornam os bancos ainda mais cautelosos, procurando mostrar que têm níveis de capital acima dos mínimos legais nos períodos de estresse - o que reduz custos de captação e afeta positivamente os resultados.
Crises anteriores mostram que, na verdade, não é necessariamente a falta de capital ou liquidez que faz os bancos se retraírem durante períodos de estresse econômico (a não ser pelas instituições de menor porte). O que costuma pesar, na verdade, é uma aversão a assumir riscos expandindo a carteira num período de mais incerteza. Como diz o ditado, você pode levar o cavalo até a beira do rio, mas não tem como obrigá-lo a beber água.
É por isso que, em períodos de crise no passado, os bancos públicos assumiram o protagonismo na oferta de crédito à economia, operando de forma anticíclica. Dirigentes das instituições federais anunciaram a intenção de fornecer linhas de crédito, mas até agora não há muitas informações sobre segmentos beneficiados e condições.