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Publicado em 15/08/2017

TLP: curar ou matar o doente? (Valor Econômico)

O governo anunciou em fins de março a decisão de substituir a TJLP – Taxa de Juros de Longo Prazo – pela TLP, a Taxa de Longo Prazo, nos financiamentos do BNDES. No intenso debate suscitado pela medida, o governo e vários analistas argumentam que a mudança irá eliminar o subsídio do crédito do BNDES e desenvolverá o mercado de capitais. Para um outro grupo de analistas, além de entidades empresariais, a TLP encarecerá e trará maior volatilidade ao crédito ao investimento, concorrendo para reduzir ainda mais a já baixa taxa de inversão do país.

Um ponto que deveria ficar claro no debate é que os créditos do nosso banco de desenvolvimento que têm por referência a TJLP em si não incorrem em subsídio, se a fonte dos recursos que os alimentam não for o Tesouro e sim os recursos do FAT, também remunerados pela TJLP.

O chamado “subsídio implícito” dos financiamentos do BNDES surgiria quando a fonte de recursos é o Tesouro, com base em sua captação no mercado, onde as taxas de juros seriam mais altas do que as praticadas pelo banco.

Mas convém observar que, do ponto de vista do tomador de recursos junto ao BNDES, mesmo as empresas com excelente avaliação de risco e enquadradas nos mais favoráveis programas do banco incorrem em um custo de financiamento muito superior à TJLP.

Tipicamente, a taxa para operações diretas do BNDES chega a um valor entre 9,1% ao ano a 13,56% ao ano, considerando a adição à TJLP (atualmente em 7% ao ano) da “Taxa do BNDES”, que varia entre 2,1% e 6,56% ao ano. Desse modo, o juro pago pelo tomador é muito maior do que a inflação ou mesmo que a Selic, que presentemente é de 9,25% ao ano.

Contudo, esta ainda não é a maior taxa do BNDES. Em uma operação corretamente considerada de prioridade máxima para o banco, como a Finame para a compra de equipamentos, o custo pode subir 4 pontos percentuais ou mais devido à cobrança de um spread adicional pelos bancos repassadores. No extinto PSI, a situação era outra, existindo subsídios, mas o programa foi descontinuado.

Na prática, as duas taxas de referência, isto é, a TJLP e a de mercado, já convivem nas operações do BNDES e isso não é de hoje. A convivência se intensificou quando da divulgação recente da nova política operacional do banco, que estabeleceu prioridade máxima para inovação, desenvolvimento sustentável, aquisição de bens de capital e infraestrutura. Nesses casos, 100% do valor financiado pelo banco pode ser referenciado à TJLP. Já os projetos de ampliação de capacidade, de grande interesse da indústria e do setor de serviços, podem contar com crédito do BNDES, mas com 70% do valor financiado a taxas de mercado, o restante com base na TJLP.

A média trimestral da NTN-B apara oscilações, mas introduz taxa flutuante pró-cíclica, que aumenta nas crises

Deve ser considerada ainda a convergência silenciosa, mas que pode ser muito efetiva entre as duas taxas. Ao se manter a TJLP em seu nível atual de 7% ao ano e sendo confirmada a projeção de mercado de 8% ao ano para a Selic ao final de 2017, praticamente não haverá distinção entre elas, já que a diferença remanescente pode ser facilmente compensada pelos spreads cobrados pelo BNDES em suas operações. Os investimentos financiados pelo BNDES permitem que as empresas gerem lucros e dividendos, e levam naturalmente à ampliação do recolhimento de impostos.

A verdadeira e duradoura convergência que irá dirimir as dúvidas e aplacar os receios de ambas as partes envolvidas no debate virá da redução da taxa de mercado, não do aumento da taxa de referência dos fundos do BNDES.

A estratégia de aproximação das taxas via redução das taxas de mercado permitiria ainda evitar alguns inconvenientes associados à TLP. Primeiro, a adoção da TLP indexaria os financiamentos do BNDES à inflação medida pelo IPCA, o que não é uma solução adequada. O Brasil deveria trilhar o caminho oposto e ter por meta retirar de sua economia qualquer tipo de indexação à inflação.

Em segundo lugar, existe ainda a questão da oscilação das taxas reais da NTN-B. O histórico dessas taxas revela uma pronunciada oscilação que pode se chocar com o requerimento de uma mínima estabilidade de taxas no período entre o momento em que o empresário toma a decisão de investir e o instante em que ele tem aprovado o financiamento do seu projeto, habilitando-se assim a implementá-lo.

Vale aqui esclarecer um aspecto corrente na vida do setor produtivo. O empresário, ao se decidir por um programa de inversões, vai em busca dos meios para financiá-lo, o que no caso brasileiro necessariamente envolve um longo processo de negociação e de análise de projeto junto ao BNDES. Dada a escassez de fontes alternativas ágeis para financiamentos de longo prazo no Brasil – isto é válido praticamente para todos os projetos de médio ou grande porte envolvendo todos os setores da economia – esse processo de busca e aprovação de financiamento demanda ao menos seis meses, podendo ir além disso nos casos de projetos de maior complexidade. Neste meio tempo a decisão de investir do empresário estaria exposta ao risco considerável de uma mudança no patamar da TLP.

Dentre as providências tomadas pelo governo para dar mais previsibilidade à taxa, uma delas, a de definir a TLP com base em uma média trimestral da NTN-B de cinco anos, suaviza um pouco a volatilidade, mas introduz uma taxa flutuante pro-cíclica uma vez que a taxa real da NTN-B sobe durante crises. Essa característica pode ser indesejável para um banco de desenvolvimento que muitas vezes precisa fomentar inversões em infraestrutura, importantes para induzir recuperações da economia.

Finalmente, a proposta do governo implicaria uma TLP possivelmente superior à taxa Selic. Em uma simulação realizada pelo economista Felipe Salto, assessor do Senado, caso a TLP já estivesse em vigor entre o mês de agosto de 2007 e dezembro de 2016, ela teria sido até 4% superior à Selic, além de muito mais volátil que esta.

Estas são as razões que levam empresários brasileiros a sugerirem a rejeição da Medida Provisória 777, em sua redação atual.

Pedro Wongtschowski é presidente do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).

 

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