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24 ESPAÇO ABRAFESC
O QUE PODEMOS
APRENDER COM A
CRISE DA AMERICANAS?
Especialista fala sobre as
consequências do episódio no
mercado de fomento e analisa como
ele contribui para o debate jurídico
O mercado ficou de cabeça para baixo, a crise evidencia a necessidade de se decorrem do inadimplemento, ou do
no dia 11 de janeiro, quando o então CEO debater a cultura jurídica de formação risco econômico da operação, mas da
da Americanas Sergio Rial renunciou de dívidas. Segundo ele, o que se viu em emissão de títulos sem causa”, afirma.
ao cargo e revelou que a empresa larga escala no caso das Americanas, se
escondia cerca de R$ 20 bi em dívidas repete diariamente no fomento. “Pouco A situação é tão delicada que, se nada for
em seu balanço. Uma semana depois, importa o tamanho do devedor, do maior feito, os problemas podem se agravar
um pedido de recuperação judicial deu ao menor, nenhum deles teme o credor ou e culminar em uma forte contração no
início a uma batalha entre a empresa a justiça. Eles não acreditam que serão mercado. Isso porque a fragilidade das
e seus principais credores. Os mais punidos por seus malfeitos”, explica. leis atrapalha a harmonia econômica
atingidos foram bancos, empresas de Zago chama a atenção para a necessidade necessária para a captação e concessão
tecnologia e pequenos fornecedores. de um arcabouço legal que garanta de crédito. “Enquanto a economia e
Entre um comunicado ao mercado e um ambiente de negócios saudável. o Poder Judiciário não derem sinais
outro, especialistas faziam contas. Ele explica que, para muitos juízes, positivos de melhoria e de proteção à
Hoje, sabe-se que a varejista acumula a recuperação judicial é apenas um ordem financeira e econômica, ainda
mais de R$ 40 bi em dívidas, sendo R$ processo formal. Se a empresa cumpriu veremos muitos FIDCs devolvendo
109 milhões com micro e pequenas todos os requisitos exigidos no artigo recursos de investidores, e a contração
empresas, R$ 62 milhões em créditos 51 da Lei de Falências e Recuperação ocorrerá naturalmente”, analisa Zago.
trabalhistas e R$ 41 bilhões em créditos Judicial é porque pode se recuperar e
sem garantia, os créditos quirografários. tem o direito ao processamento da ação. LUZ NO FIM DO TÚNEL
Essa simplificação formal do processo,
Por mais que o episódio não tenha porém, passa a ideia de que, em nome da Felipe Zago chama atenção para
atingido diretamente o mercado de proteção dos empregos e da preservação uma mudança que ocorrerá em
fomento, ele traz ensinamentos e da empresa, é possível sair impune breve no mercado e deverá ampliar
consequências que devem ser observadas de uma recuperação judicial. Segundo um pouco a segurança no setor: a
com cuidado. Para o sócio-diretor da Zago, já foram registrados avanços implantação das duplicatas escriturais,
FZ Advogados Associados, Felipe Zago, importantes, mas ainda insuficientes para regulamentadas em maio de 2020 e que
reverter a sensação de insegurança. aguardam as definições de detalhes
O especialista alerta, inclusive, que esse para o funcionamento do sistema.
cenário já impacta no mercado de FIDCs.
“Há cinco ou sete anos, não era comum A partir daí, segundo Zago, teremos
vermos nas recuperações judiciais, mais transparência nas operações de
grandes volumes de créditos em nome risco-sacado. “Por meio do registro, será
de FIDCs. Essa realidade mudou muito. garantida a negociação de papéis sem
Em diversos casos, as FIDCs já são a duplicidade, o que evitaria as fraudes
maior parte dos credores arrolados. dessa natureza. Será possível atestar a
Em casos extremos, as dívidas sequer unicidade de uma duplicata e registrar
toda a movimentação feita por ela. Ficará
mais difícil, por exemplo, que um mesmo
papel seja usado por uma empresa para
se financiar mais de uma vez”, finaliza.
REVISTA DO SINFAC / SÃO PAULO